Busca

Prefeitura estuda transferir Delegacia da Mulher para prédio do Fórum Velho

Anúncio é feito pelo vereador Cristiano Passos (Republicanos); segundo ele, medida tem como objetivo tirar ‘tudo o que não presta do Centro’

Maíra Fernandes

Classe artística critica e reivindica o imóvel que já abrigou a Oficina Cultural Grande Otelo. Foto: Divulgação/Prefeitura de Sorocaba

O prédio do Fórum Velho, que abrigava a Oficina Cultural Grande Otelo e é reivindicado pela classe artística para continuar como espaço cultural, pode ser o novo endereço da DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) de Sorocaba que, atualmente, está no Jardim América, zona oeste da cidade.

A informação, repassada pelo vereador Cristiano Passos (Republicanos), é de que as tratativas entre o Executivo e o Deinter-7 (Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior) para formalizar o processo já vêm ocorrendo. A ideia é que a presença policial no local extinga “tudo o que não presta do Centro”, afirma.

Passos conta que o assunto surgiu em uma conversa entre ele e os delegados Wilson Negrão e José Urban Filho. Inclusive, em uma de suas redes sociais, o vereador publicou uma imagem junto aos policiais, em 17 de fevereiro.

“Existe uma tratativa para que o Fórum Velho se transforme na Delegacia da Mulher de Sorocaba. Isso vai ajudar muito. Vai tirar de uma região que é de difícil acesso e evitar pagar aluguel, além de tirar tudo o que não presta do Centro também. Estamos discutindo isso com o governo municipal junto ao Deinter-7”, falou o vereador, em sessão legislativa realizada na semana passada.

Vale ressaltar que a cessão do prédio ao município, ocorrido por meio do decreto estadual 66.339, de 15 de dezembro de 21, condiciona a cessão à utilização para fins culturais. “O imóvel de que trata o ‘caput’ deste artigo destinar-se-á ao desenvolvimento de atividades culturais do município”, descreve o documento assinado pelo então governador João Doria (PSDB).

Questionado sobre o artigo que define que o imóvel precisa ter como fim a cultura, o Passos disse, de maneira vaga, que “a cultura não vai ficar fora dali”. No entanto, não esclareceu qual o projeto para abrigar competências tão distintas no mesmo prédio. “No momento apropriado vocês vão saber”, concluiu a conversa.

O Portal Porque procurou a Comissão de Cultura da Câmara, por meio dos vereadores Fausto Peres (Podemos) e Fabio Simoa (Republicanos), para comentar sobre o assunto, mas não obteve resposta. Do mesmo modo, questionou a Secretaria Municipal de Cultura e o próprio secretário, Luiz Antonio Zamuner, também sem retorno.

O Deinter-7 foi outro questionado, por meio da assessoria de imprensa e, até a divulgação desta matéria, não mandou resposta. Ainda assim, o espaço está à disposição de todos aqueles que queiram se manifestar a respeito do assunto.

Artistas criticam

O anúncio feito pelo vereador Cristiano Passos (Republicanos) desagradou a classe artística sorocabana que, há anos, briga pela reforma e pela retomada do espaço que abrigou a Oficina Cultural Grande Otelo, um dos mais importantes centros de fomento e espaço cultural de Sorocaba.

Com o imóvel fechado desde 2014 para uma obra de restauro que nunca aconteceu, a esperança da classe artística era de que, com a cessão do prédio para o município, bem como a imposição via decreto, em 2021, sobre o modo de uso, o local voltaria à sua vocação cultural.

Contudo, desde o fechamento, o prédio é sondado por outras instituições, como a Acso (Associação Comercial de Sorocaba) que, em 2019, reafirmou o pedido ao Governo do Estado de cessão em comodato. O próprio município já manifestou interesse em utilizá-lo para abrigar a Secretaria de Educação.

Sobre a possibilidade de o local abrigar a DDM, os artistas ouvidos pelo Porque foram categóricos ao afirmar que se trata de um absurdo, principalmente a ideia de manter uma estrutura policial e um ambiente artístico e cultural em um mesmo espaço, ambos com dinâmicas diferentes.

“O espaço lá nem é muito grande para colocar dois órgãos dividindo o local. Sem contar que as atividades culturais, como aulas de música, teatro, por exemplo, normalmente são barulhentas, destoa muito do ambiente de acolhimento que tem de ser uma delegacia específica para atender mulheres”, comenta a diretora teatral Nanaia de Simas.

Para ela, foi um “tiro no pé”, passar a cessão do prédio para o município, pois diferentes órgãos e entidades cresceram os olhos no imóvel, imponente e localizado na região central. “Se estivesse com o Estado nós pressionaríamos e ele continuaria sua vocação, sendo um espaço cultural. Agora, pelo município, tem despertado a cobiça.”

Organizadora do Movimento Ocupação Artística na Praça Frei Baraúna, que acontece desde a cessão ao município e, principalmente, para reforçar a vocação cultural do espaço, a cantora Márcia Mah repudiou a intenção, bem como o fato de a própria Comissão de Cultura da Câmara, com quem tem diálogo frequente, não avisar a classe artística, ouvi-los ou mesmo se opor.

“É uma falta de respeito com a sociedade civil. Essa administração não nos ouve e não conversa conosco sobre essas questões. Temos feito esse movimento de pertencimento [Ocupação da Praça Frei Baraúna] para reforçar o quanto aquele espaço é da cultura e precisa ser mantido. Cada vez mais perdemos nossos espaços culturais. Sorocaba vai jogando um pá de cal sobre a memória de tudo e a cultura, a arte e o lazer ficam sempre em segundo plano”, desabafa a artista.

Outras urgências

Para a advogada e gestora cultural Grace Carrera, antes de definir a destinação precisa ser discutido, com transparência e seriedade, o restauro do imóvel. “A preocupação dos vereadores deveria ser em saber se já tem projeto de restauro, qual será o valor da obra, quais serão as fontes de custeio. Aquele prédio tem graves problemas estruturais que uma mera pintura de fachada não dá conta de resolver.”

Ainda conforme ela, o prédio do Fórum Velho é tombado tanto pelo município como pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) e esses órgãos precisam ser consultados sobre qualquer intervenção.

“Há um desejo da classe artística de que o prédio permaneça como centro cultural, pelo papel que desempenhou para a cultura de 1994 até 2013. Agora é discutir o restauro, pois não será uma obra rápida e barata. Por isso, não vejo sentido discutir a destinação neste momento. Qualquer definição poderá ser revista até a conclusão da obra”, finaliza Grace Carrera.

 

mais
sobre
Deinter 7 DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER Fórum Velho Oficina Cultural Grande Otelo Praça Frei Baraúna
LEIA
+