Busca

Aeroclube de Sorocaba tenta reverter ordem de despejo por meio de ação judicial

Privatização feita pelo governo do Estado incluiu erroneamente área ocupada pelo Aeroclube, que seria da Prefeitura de Sorocaba

Fabiana Blazeck Sorrilha (Portal Porque)

Terreno onde Aeroclube construiu quatro hangares foi cedido pela Prefeitura, que seria, segundo a entidade, proprietária da área. Foto: divulgação

O Aeroclube de Sorocaba completa 81 anos nesta sexta-feira, dia 5 de maio, sem ter motivos para festejar. Mesmo sendo responsável por formar mais de 2.500 pilotos ao longo de sua existência e ocupando o lugar de única escola de pilotagem num raio de 100 km do município, o Aeroclube foi despejado de suas instalações no dia 28 de abril pela Rede Voa, concessionária que assumiu a responsabilidade pelo aeroporto de Sorocaba.

Agora, o Aeroclube tenta reverter a decisão, por meio de ação judicial que contesta a ordem de despejo. A privatização do aeroporto, segundo o Aeroclube de Sorocaba, incluiu áreas pertencentes à Prefeitura de Sorocaba, cedidas à entidade para construir suas instalações. Apesar disso, a Prefeitura não contestou a privatização de uma área que lhe pertence, dando margem à ordem de despejo.

O Aeroclube estava instalado numa área de 1,3 milhão de metros quadrados anexa ao Aeroporto Estadual Bertran Luiz Leupolz. O clube de voos e atividades aeronáuticas tem a concessão de uso da área desde meados de 1990. Já a Voa alega que a área agora lhe pertence e que cumpriu determinação judicial, em consonância com liminar de reintegração de posse concedida pela Justiça.

O Aeroclube ocupava uma área pública municipal e foi responsável por construir, com a aprovação da Prefeitura de Sorocaba, quatro hangares na área que pertence à Prefeitura de Sorocaba. Um dos hangares estava cedido ao clube e era usado para suas atividades sociais, administrativas e educativas.

O investimento no hangar ocorreu após assinatura de um contrato de concessão de uso da área pública municipal para fins aeroviários com o atualmente extinto Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo). O contrato dava direito ao uso da área por 15 anos, renovado por igual período em 2007. Como não houve manifestação contrária à renovação pelas partes, o contrato continuou a valer automaticamente, conforme previsão contratual, nos termos do artigo 463 do Código Civil.

No trâmite de concessão do aeroporto, a área pública municipal do Aeroclube foi incluída erroneamente no processo licitatório de concessão privada. Conforme conta Telmo Pereira Cardoso, ex-presidente do Aeroclube, o edital previu concessão de uma área total de mais de 2,3 milhões metros quadrados, enquanto a área total aeroportuária é de aproximadamente 1 milhão de metros quadrados. Ou seja, a área pública municipal restante e onde está o Aeroclube não deveria ter sido rifada na concessão e passada para a responsabilidade da Voa.

A Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) informou, por meio de nota, que a posse da área ocupada pelo Aeroclube foi transferida à concessionária Voa por determinação judicial e que ela é responsável pela operação, administração e investimentos no aeroporto de Sorocaba desde abril do ano passado, após vencer a licitação do Bloco Sudeste dos aeroportos regionais de São Paulo.

Além da unidade local, o lote é composto por outros dez aeroportos. A promessa é de que serão investidos R$ 11,9 milhões no Aeroporto Bertram Luiz Leupolz durante o período de concessão para modernização e ampliação do atendimento do aeroporto.

Sem abertura ao diálogo

Com a concessão, a Voa quer que o Aeroclube pague para usar o espaço que um dia construiu e investiu em melhorias com recursos próprios. “Eles querem cobrar valores elevados de aluguel para utilizarmos áreas que foram construídas com recursos do Aeroclube”, diz Telmo, reforçando que tem alternativas para um acordo entre o Aeroclube e a Voa, para que a concessionária fique com o hangar II em troca da área do hangar III. Assim, o clube poderia funcionar com suas atividades rotineiras e a pista de aeromodelismo.

Já a concessionária afirma que não se absteve de tentar diálogo com o Aeroclube e aguarda a sua regularização, de acordo com a legislação brasileira e aeronáutica, no decorrer do processo judicial. O atual presidente do Aeroclube de Sorocaba, Milton Andreoli, frisa que a escola de pilotagem está com autorização de funcionamento pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) até 2025 e, somente a partir daí, se exigirá que se torne um Centro de Instrução de Aviação Civil (Ciac).

“Recebemos a notícia do despejo com muita tristeza e dor no coração, pois, sendo nascido e criado nesta cidade, nunca imaginei que um dia isso pudesse acontecer com a entidade que deu início a tudo que existe no aeroporto de Sorocaba”, lamenta Andreoli. O Aeroclube já entrou na Justiça, por meio do advogado Cláudio Dias Batista, com ação contestando a medida judicial de despejo concedida à VOA.

Falta de apoio do governo municipal

Telmo Pereira Cardoso lamenta a falta de apoio do governo municipal para preservar o Aeroclube em funcionamento, manter e zelar pela permanência da área pública cedida. Nos anos 40, o alemão Adolfo Frederico Schleifer, um apaixonado por aviões, doou aproximadamente 40 alqueires, ou 1 milhão de metros quadrados, para a fundação e instalação do Aeroclube de Sorocaba e mais outros alqueires para formar, então, o campo de aviação sorocabano. “A doação, ao que consta, a doação da área de 40 alqueires não foi para a Prefeitura e, sim, para o Aeroclube mas, com o tempo, a área deve ter passado para a Prefeitura”, conta.

Ele também diz que o governo municipal não contestou o edital de privatização do aeroporto, além de não concluir o processo de tombamento histórico do Aeroclube e não regularizar e legalizar as construções e áreas ocupadas pela entidade, há anos. “Desde os anos 90, na minha gestão, estamos tentando sem sucesso junto à Prefeitura legalizar as construções e regularizar o uso das áreas publicas municipais. A Prefeitura não consegue levar o assunto adiante, e isso se dá, a meu ver, por excesso de burocracia, porque nem eles sabem quem é efetivamente o dono das áreas e, quem sabe, outros interesses que desconheço”, assevera Telmo.

Ele pede ainda que a Voa exerça seu direito e obrigação de administrar o aeroporto, mas respeite o Aeroclube e sua Escola de Pilotagem, que, por lei, são, por exemplo, isentos do pagamento de taxas aeroportuárias.

“O Aeroclube de Sorocaba é importante na vida de cada cidadão sorocabano que aqui nasceu e cresceu assistindo as apresentações da esquadrilha da fumaça em festas aviatórias que aqui aconteciam a cada ano. E não é barato para se formar piloto de avião, devido aos altos custos envolvidos como o combustível e a manutenção da aeronave. O Aeroclube, sendo entidade sem fins lucrativos, cumpriu a sua função com maestria, formando milhares de pilotos que aqui vinham de todo o Brasil e hoje estão espalhados pelo País e pelo mundo, muitos desses já aposentados, inclusive.”, finaliza Milton.

A Prefeitura de Sorocaba foi procurada para se posicionar sobre o assunto, mas não respondeu aos questionamentos do Portal Porque.

mais
sobre
aeroclube de sorocaba área municipal ordem de despejo privatização rede voa
LEIA
+